Como já dissemos o evangelho de Lucas foi
escrito com o propósito principal de apresentar um relato fiel e organizado
visando estabelecer os fatos a respeito do ministério de Jesus e sua
importância para a história da salvação, além de fornecer parâmetros para a
igreja em sua pregação de arrependimento e perdão em nome de Jesus para todas
as nações.
II. PREPARAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DE JESUS (1.5-4.13) – continuação.
Como já dissemos, veremos até o capítulo 4,
verso 13, que Lucas registrou acontecimentos importantes antes do início do
ministério público de Jesus; salientou que os papéis de João e de Jesus estavam
interligados, e que Deus estava intervindo para trazer salvação a seu povo.
Destarte, essa segunda parte, conforme a
BEG, foi dividida em três: A. Duas mães, duas crianças (1.5-2.52) – já vimos; B. O ministério de João como o
precursor (3.1-20) – veremos agora;
e, C. A iniciação de Jesus (3.21-4.13) – começaremos
a ver agora.
Lucas, neste capítulo 3 de seu evangelho,
tal qual um cirurgião diz exatamente o momento em que a palavra de Deus veio a
João Batista, filho de Zacarias.
Ele também percorria as áreas vizinhas e
pregava a palavra de Deus. A sua principal pregação e o cume dela seria o
momento exato em que ele apontasse para o Cristo e dissesse: - eis o Cordeiro
de Deus que tira os pecados do mundo!
É por isso que toda pregação enviada por
Deus e dada aos homens para anunciar aos homens deve, obrigatoriamente, passar
por Jesus Cristo. Muitos líderes religiosos e respeitadas autoridades e gurus
do mundo inteiro sempre tem uma “boa” palavra para dizer, mas nenhuma delas
aponta para Cristo.
Se não apontar para onde João Batista
apontava e o Pai apontou e igualmente o Espírito Santo e ainda o próprio Jesus,
o Filho de Deus, e mais ainda, os seus fieis discípulos, apóstolos e
seguidores, a palavra não terá sido nada além de meras palavras sem poder algum
de transformação do homem.
Somente o evangelho - e o evangelho é Jesus
Cristo - pode tirar o homem de sua prisão do pecado, por isso que Jesus veio
para destruir as obras do diabo. Ele, João, em I Jo 3:8, quando diz “as obras
do diabo” não estava falando de enfermidades, nem de escassez, mas das obras do
diabo que significam a escravidão do pecado.
Vejamos os fatos em maiores detalhes, com a
boa ajuda da BEG.
B. O ministério de João como o precursor (3.1-20).
Dos versos de 1 a 20, veremos o ministério
precursor de João. Tendo relatado os acontecimentos ocorridos na infância de
Jesus, Lucas prossegue para considerar a ligação do ministério de João como
precursor de Jesus.
A datação elaborada de Lucas é colocada no início
do ministério de João, e não no início do ministério de Jesus; isso demonstra a
importância que Lucas deu a João em seu Evangelho.
Essa data era provavelmente 27-29 d.C. Lucas
especifica o ano e as principais autoridades à época. O ano era o décimo quinto
do império de Tibério César, sendo Pôncio Pilatos presidente da Judéia, e
Herodes (em seu testamento, Herodes, o Grande, deixou a administração da Judeia
para Arquelau e as tetrarquias para Filipe e Antipas. Porém, Arquelau fez um
governo tão ruim que os romanos o retiraram do cargo e indicaram o seu próprio
governador, Pôncio Pilatos), tetrarca da Galiléia e seu irmão Filipe tetrarca
da Itureia e da província de Traconites, e Lisânias tetrarca de Abilene (um
tetrarca era, tecnicamente, um governador que administrava a quarta parte,
porém o termo acabou sendo usado para designar regentes insignificantes).
O Herodes relatado aqui é Herodes Antipas.
A região que Filipe governava ficava a nordeste do mar da Galileia. Não se tem
nenhuma outra informação quanto ao governador Lisânias, mas se sabe que Abilene
era uma área mais ao norte das regiões mencionadas aqui.
Embora Lucas – vs. 2 – cite como sumos
sacerdotes Anás e Caifás, os judeus tinham apenas um sumo sacerdote de cada
vez. Os romanos depuseram Anás e indicaram em seu lugar Caifás, genro de Anás,
como sumo sacerdote.
Apesar da imposição romana para que Caifás exercesse
a função oficialmente, muitos judeus ainda consideravam Anás como o verdadeiro
sumo sacerdote.
Foi dentro desse contexto e época que veio
a palavra de Deus, no deserto, ao João, filho de Zacarias. A mensagem de João
não era dele mesmo, mas a diligente palavra do próprio Deus.
Por isso que saiu João a percorrer toda a
terra ao redor do Jordão pregando o batismo de arrependimento, para perdão de
pecados – vs. 3.
Nessa época, o ritual de lavar associado
com a adoração no templo (p. ex., Êx 30.18-21; Nm 19.9ss.) havia sido estendido
para no mínimo outros dois usos.
üPrimeiro,
os judeus batizavam os gentios que desejavam ser circuncidados e integrados à
comunidade da aliança de Israel.
üSegundo,
alguns grupos judaicos radicais exigiam a purificação com água para aqueles que
desejassem ingressar em suas comunidades remanescentes.
João chamava os remanescentes de Israel
para que o seguisse e fosse batizado para demonstrar arrependimento, conforme o
que estava preconizado nas Escrituras, em especial Isaías 40.3-5.
Os quatro Evangelhos aplicam Is 40.3 a João
e seu ministério. Somente o Evangelho de Lucas inclui Is 40.4-5 (citado em Lc
3.5-6), que focaliza o fato de que toda a humanidade verá a salvação que Deus
trará para o seu povo. O tema da consciência de Cristo dos gentios era muito
importante para Lucas (p. ex., 2.32; 4.24-27; 24.47).
A pregação de João era muito contundente e
nada pacífica ou meiga. Ele chamava a atenção do povo para Deus com veemência e
convicção. Uma forte advertência foi dirigida àqueles que se diziam filhos de
Abraão. O fato de ser judeu não os pouparia da ira vindoura.
Ele dizia, entre outras coisas, que já estava
posto o machado à raiz. Essa frase indica um julgamento infalível e veloz
contra aqueles que não derem bom fruto, os quais seriam lançados no fogo - um
símbolo de julgamento (p. ex., Dt 32.22; Is 26.11). Do mesmo modo que seus
conterrâneos, João esperava que o Messias trouxesse, simultaneamente, salvação
para o povo de Deus e julgamento contra os seus inimigos.
Quando Jesus não cumpriu essa expectativa,
sérias dúvidas começaram a surgir na mente de João (Mt 11.3). Jesus explicou
que o reino de Deus estava vindo de um modo que não havia sido previsto.
A multidão começou a se assustar com ele e
lhe perguntavam o que deveriam fazer e ele as instruía para repartirem as suas
túnicas - a túnica era uma roupa de baixo. Normalmente, as pessoas usavam uma
só. João sugeriu que o homem que tivesse duas deveria entregar a segunda para
alguém que não tinha nenhuma. Ele também aplicou o mesmo princípio ao alimento –
vs. 11.
Até publicanos chegaram a João para serem
batizados. Também conhecidos como cobradores de impostos para Roma (homens que
cobravam os impostos devidos pelos habitantes da cidade), os publicanos pagavam
aos romanos a quantia que estes exigiam, mas muitas vezes cobravam das pessoas
uma quantia maior, guardando para si mesmos a diferença. Para eles, era uma
forte tentação enriquecer por meio da cobrança indevida.
João os advertiu para todos serem honestos.
Os quatro Evangelhos incluem um relato do ministério de João chamando as
pessoas para se arrependerem em preparação para a vinda de Jesus. Mas somente
Lucas relata as respostas que João deu para aqueles que tinham dúvidas sobre o
que a mensagem implicaria para eles.
Ainda se achegavam a ele, soldados que
queriam saber o que fazer e ele não reprimia sua atividade principal, mas pedia
que fossem honestos no desempenho delas, além de andarem contentes com o soldo
que recebiam – vs. 14.
Havia especulações messiânicas por toda
parte, mas João afirmou claramente que ele não era o Messias, pois alguém maior
do que ele estava vindo.
Ele João deixou claro que estava batizando
com água somente, mas o Cristo batizaria com o Espírito Santo e com fogo.
O Espírito Santo representa a bênção de
Deus, assim como o fogo representa o julgamento (vs. 9). Conforme a BEG, a pá
(forcado) também implicava julgamento, pois era usada para jogar os grãos no ar
após terem sido pisoteados pelo boi, com o objetivo de separar a palha (que era
queimada) dos grãos.
João mesmo nem se considera digno de ao
menos desatar as sandálias dele de seus pés.
Nas escolas rabínicas, o estudante não
pagava o professor, mas por outro lado era exigido que prestasse serviços.
Contudo, desatar as sandálias era um serviço que nem os alunos faziam, pois era
considerado muito humilhante. Desse modo, João colocou-se numa posição de
humildade.
O verso 17 deixa claro que não dá para
brincar com aquele que nos visitou e nos deixou o arrependimento de João e o
perdão de nossos pecados por meio de seu sangue. É dele as ações com a pá que
servirá para limpar a sua eira e separar o trigo da palha. O trigo, ele
recolherá em seu celeiro, mas a palha, queimará em fogo inextinguível. Você é
trigo ou você é palha?
João foi um pregador que precisamos
hodiernamente. Por causa de sua palavra de pregação, ele acabou sendo preso.
Herodes Antipas divorciou-se de sua mulher para casar-se com sua sobrinha
Herodias, que por sua vez era casada com o irmão dele, Filipe. João passou a
denunciar esse relacionamento imoral, de modo que Herodes o colocou na prisão
da fortaleza de Maquero, localizada a leste do mar Morto.
C. A iniciação de Jesus (3.21-4.13).
Veremos, doravante, dos versos de 21 ao 4.13,
a iniciação de Jesus. Lucas relata que Jesus, antes de iniciar o seu ministério
público, submeteu-se ao batismo de João e à tentação no deserto. Esses
acontecimentos o prepararam para a obra pública que realizaria a seguir.
Os quatro Evangelhos relatam que o Espírito
Santo desceu sobre Jesus por ocasião do seu batismo. A pomba era geralmente
considerada um símbolo de Israel, porém aqui representou o sinal externo da
vinda do Espírito Santo sobre Jesus. A voz celestial aprovou Jesus no início do
seu ministério público.
Naquele batismo de Jesus por João para se
cumprir as Escrituras identificamos os testemunhos dos homens e de Deus. Dos homens
por causa de João Batista e das testemunhas oculares ali presentes. De Deus por
causa da palavra do Pai e da descida do Espírito Santo sobre ele.
Em seguida, Lucas o identifica na
genealogia.
A genealogia de Lucas difere da registrada
em Mateus, em parte porque Mateus retrocede até Abraão, enquanto Lucas recua
até Adão.
Os relatos também diferem porque alguns
nomes são diferentes. Alguns sugerem que Mateus registra a linhagem de José,
enquanto Lucas registra a de Maria. Porém, Lucas começa especificamente com
"José, filho de Eli" (vs. 23).
Pode ser que a genealogia de Lucas
represente a descendência física de José, enquanto a de Mateus se refira à
linhagem legítima do trono de Davi; contudo, não há como ter certeza disso. O
que está claro é que ambos os Evangelhos afirmam que Jesus era descendente de
Davi.
Lc 3:1 No décimo quinto ano do reinado
de Tibério César,
sendo Pôncio
Pilatos governador da Judéia,
Herodes,
tetrarca da Galiléia,
seu irmão
Filipe, tetrarca da região da Ituréia
e Traconites,
e Lisânias, tetrarca de Abilene,
Lc 3:2 sendo
sumos sacerdotes
Anás
e Caifás,
veio
a palavra de Deus a João,
filho
de Zacarias,
no
deserto.
Lc 3:3 Ele percorreu toda a circunvizinhança
do Jordão,
pregando
batismo de arrependimento
para
remissão de pecados,
Lc
3:4 conforme está escrito
no
livro das palavras do profeta Isaías:
Voz
do que clama no deserto:
Preparai
o caminho do Senhor,
endireitai
as suas veredas.
Lc
3:5 Todo vale será aterrado,
e
nivelados todos os montes
e
outeiros;
os
caminhos tortuosos
serão
retificados,
e
os escabrosos, aplanados;
Lc
3:6 e toda carne
verá
a salvação de Deus.
Lc 3:7 Dizia
ele, pois, às multidões que saíam para serem batizadas:
Raça
de víboras,
quem
vos induziu a fugir da ira vindoura?
Lc 3:8
Produzi, pois,
frutos
dignos de arrependimento
e
não comeceis a dizer entre vós mesmos:
Temos
por pai a Abraão;
porque eu vos
afirmo que destas pedras
Deus pode
suscitar filhos
a
Abraão.
Lc
3:9 E também já está posto o machado à raiz das árvores;
toda
árvore, pois, que não produz bom fruto
é
cortada
e
lançada ao fogo.
Lc 3:10
Então, as multidões o interrogavam, dizendo:
Que
havemos, pois, de fazer?
Lc 3:11
Respondeu-lhes:
Quem
tiver duas túnicas,
reparta
com quem não tem;
e quem tiver
comida,
faça
o mesmo.
Lc 3:12 Foram
também publicanos
para
serem batizados e perguntaram-lhe:
Mestre,
que havemos de fazer?
Lc 3:13
Respondeu-lhes:
Não
cobreis mais do que o estipulado.
Lc 3:14
Também soldados lhe perguntaram:
E
nós, que faremos?
E ele lhes
disse:
A
ninguém maltrateis,
não
deis denúncia falsa
e
contentai-vos com o vosso soldo.
Lc 3:15
Estando o povo na expectativa,
e discorrendo
todos no seu íntimo a respeito de João,
se
não seria ele, porventura, o próprio Cristo,
Lc 3:16 disse
João a todos:
Eu,
na verdade,
vos
batizo com água,
mas vem o que
é mais poderoso do que eu,
do
qual não sou digno de desatar-lhe
as
correias das sandálias;
ele
vos batizará
com
o Espírito Santo
e
com fogo.
Lc
3:17 A sua pá,
ele
a tem na mão,
para
limpar completamente a sua eira
e
recolher o trigo no seu celeiro;
porém
queimará
a
palha em fogo inextinguível.
Lc 3:18
Assim, pois, com muitas outras exortações
anunciava
o evangelho ao povo;
Lc 3:19 mas
Herodes, o tetrarca,
sendo
repreendido por ele,
por
causa de Herodias,
mulher
de seu irmão,
e por todas
as maldades
que
o mesmo Herodes havia feito,
Lc 3:20
acrescentou ainda sobre todas
a
de lançar João no cárcere.
Lc 3:21 E
aconteceu que,
ao
ser todo o povo batizado,
também
o foi Jesus;
e, estando
ele a orar,
o
céu se abriu,
Lc
3:22 e o Espírito Santo
desceu
sobre ele
em
forma corpórea como pomba;
e
ouviu-se uma voz do céu:
Tu
és o meu Filho amado,
em
ti me comprazo.
Lc 3:23 Ora, tinha Jesus
cerca de
trinta anos ao começar o seu ministério.
Era, como se
cuidava,
filho
de José,
filho
de Eli;
Lc
3:24 Eli, filho de Matate,
Matate,
filho de Levi,
Levi,
filho de Melqui,
este,
filho de Janai,
filho
de José;
Lc
3:25 José, filho de Matatias,
Matatias,
filho de Amós,
Amós,
filho de Naum,
este,
filho de Esli,
filho
de Nagai;
Lc
3:26 Nagai, filho de Maate,
Maate,
filho de Matatias,
Matatias,
filho de Semei,
este,
filho de José,
filho
de Jodá;
Lc
3:27 Jodá, filho de Joanã,
Joanã,
filho de Resa,
Resa,
filho de Zorobabel,
este,
de Salatiel,
filho
de Neri;
Lc
3:28 Neri, filho de Melqui,
Melqui,
filho de Adi,
Adi,
filho de Cosã,
este,
de Elmadã,
filho
de Er;
Lc
3:29 Er, filho de Josué,
Josué,
filho de Eliézer,
Eliézer,
filho de Jorim,
este,
de Matate,
filho
de Levi;
Lc
3:30 Levi, filho de Simeão,
Simeão,
filho de Judá,
Judá,
filho de José,
este,
filho de Jonã,
filho
de Eliaquim;
Lc
3:31 Eliaquim, filho de Meleá,
Meleá,
filho de Mená,
Mená,
filho de Matatá,
este,
filho de Natã,
filho
de Davi;
Lc
3:32 Davi, filho de Jessé,
Jessé,
filho de Obede,
Obede,
filho de Boaz,
este,
filho de Salá,
filho
de Naassom;
Lc
3:33 Naassom, filho de Aminadabe,
Aminadabe,
filho de Admim,
Admim,
filho de Arni,
Arni,
filho de Esrom,
este,
filho de Perez,
filho
de Judá;
Lc
3:34 Judá, filho de Jacó,
Jacó,
filho de Isaque,
Isaque,
filho de Abraão,
este,
filho de Tera,
filho
de Naor;
Lc
3:35 Naor, filho de Serugue,
Serugue,
filho de Ragaú,
Ragaú,
filho de Faleque,
este,
filho de Éber,
filho
de Salá;
Lc
3:36 Salá, filho de Cainã,
Cainã,
filho de Arfaxade,
Arfaxade,
filho de Sem,
este,
filho de Noé,
filho
de Lameque;
Lc
3:37 Lameque, filho de Metusalém,
Metusalém,
filho de Enoque,
Enoque,
filho de Jarede,
este,
filho de Maalalel,
filho
de Cainã;
Lc
3:38 Cainã, filho de Enos,
Enos,
filho de Sete,
e
este, filho de Adão,
filho
de Deus.
Desde Jesus
Cristo até Adão são 77 gerações, ou seja, 11 x 7 gerações. Em Mateus temos 42
gerações, ou seja, 6 x 7 gerações, ou, 3 x 14 gerações, mas somente contadas de
Abraão até Cristo.
A
BEG expõe neste capítulo um artigo teológico muito interessante sobre a questão
da humanidade de Cristo ao qual reproduzimos abaixo, na íntegra:
A humanidade plena de Jesus: Que
tipo de homem ele foi?[1]
As Escrituras apresentam Jesus de maneira clara como um ser plenamente
humano e plenamente divino. Ele é uma só pessoa, mas possui duas naturezas: uma
humana e outra divina.
A declaração da humanidade plena de Cristo é essencial para a fé
cristã. Tanto que o apóstolo João condena severamente aqueles que negam
"que Jesus Cristo veio em carne" (1Jo 4.2; veja também 2 Jo 7). Essas
palavras foram dirigidas a uma forma antiga da heresia conhecida como docetismo
(do termo grego dokeo, "parecer"). Os docetistas ensinavam que Jesus
era divino (porém não o próprio Deus), mas que apenas parecia humano. Alegavam
que era uma espécie de fantasma, um mestre que, na verdade, não viveu e morreu
como ser humano.
As Escrituras deixam claro que Jesus era um homem. Ele experimentou
limitações humanas como a fome (Mt 4.2), o cansaço (Jo 4.6) e o desconhecimento
de certos fatos (Mc 13.32; Lc 8.4547). Experimentou a dor do choro (Jo 11.35,38),
da aflição (Mc 14.32-42; Lc 12.50; Hb 5.7-10) e do sofrimento na cruz (Mt
27.46; Mc 15.34). Uma vez que era divino, Jesus não podia pecar (veja o artigo
teológico "A impecabilidade de Jesus", em Hb 4); mas, uma vez que era
humano, ainda podia ser verdadeiramente tentado (Hb 4.15). Jesus também
precisava lutar contra as tentações, mas sempre resistia até vencê-las (Mt
4.1-11). Podemos inferir pela experiência no Getsêmani que as suas lutas foram,
por vezes, mais intensas e agonizantes do que jamais conseguiremos imaginar (Mt
26.36ss).
O livro de Hebreus enfatiza que se a humanidade de Jesus não fosse
plena, ele não seria qualificado para nos ajudar a atravessar as tribulações da
existência humana (Hb 2.17-18; 4.15-16; 5.2,7-9). Mas, devido à sua experiência
humana, ele garante que em todas as nossas dificuldades, podemos estar certos
de sua intercessão compassiva por nós diante do Pai (Hb 7.25).
Infelizmente, muitos cristãos bem-intencionados se concentram de modo
excessivo na divindade de Jesus, a ponto de quase excluírem a sua humanidade
crendo que, com isso, estão honrando ao Senhor. Formas atuais da heresia antiga
do monofisitismo (a ideia de que Jesus possuía apenas uma natureza) também
tendem a minimizar o fato de que Jesus foi plenamente humano. Há quem suponha
que Jesus apenas fingiu ignorar certos fatos; afinal, ele era divino e
onisciente (sabia todas as coisas). Do mesmo modo, há quem negue que Jesus de fato
sentia fome e cansaço, crendo que sua divindade energizava o seu corpo humano
de modo contínuo e sobrenatural.
No entanto, a doutrina bíblica da encarnação afirma que o Filho de Deus
viveu sua vida divina-humana na sua mente e no seu corpo humano e por meio
deles em todas as áreas, maximizado a sua identificação com aqueles que ele
havia vindo para salvar, bem como a sua empatia.
A ideia de que Jesus alternava essas duas naturezas, ora agindo em sua
humanidade, ora em sua divindade, também é equivocada. Ele suportou todo o seu
sofrimento, incluindo a agonia da cruz, e morreu na unidade de sua pessoa
divina-humana. Não obstante, alguns atos e características de Jesus podem ser
atribuídos corretamente à sua natureza divina, e outros à sua natureza humana.
O Concílio de Calcedônia (451 d.C.) expressou essa doutrina como "a
propriedade peculiar de cada natureza preservada e unida em uma só pessoa e
subsistência" (PNPN 2, vol. 14, p. 265). Por exemplo, enquanto em sua
humanidade Jesus desconhecia certos fatos, em sua divindade ele era, ao mesmo
tempo, onisciente — por mais difícil que seja de entendermos como isso era
possível.
O reconhecimento da humanidade plena de Jesus é essencial para a fé
cristã devido ao papel especial conferido por Deus aos seres humanos como
portadores de sua imagem. A humanidade foi designada como o meio pelo qual
aprouve a Deus demonstrar a sua glória e estender o seu reino sobre toda a
terra (veja o artigo teológico "O reino de Deus", em Mt 4). Mesmo
depois da queda em pecado, Deus ainda declarou que os descendentes de Eva
esmagariam os descendentes da serpente sob os seus pés (Gn 3.15). Essa promessa
antiga se cumpriu em Jesus, pois ele foi um ser plenamente humano que serviu a
Deus fielmente e recebeu como recompensa um nome que está acima de todo nome.
Por meio de Cristo, a vitória da humanidade sobre o mal está assegurada.
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